Poucos meses após o presidente Jair Bolsonaro afirmar que o governo não deveria ir atrás de farmacêuticas e o general Eduardo Pazuello declarar que receberia uma “avalanche” de propostas, o Ministério da Saúde teve de recorrer à Embaixada da China para buscar 30 milhões de doses do produto da Sinopharm. No apelo ao país que já foi criticado pelo presidente e seus aliados mais próximos, o governo muda o tom e alerta que “por falta de doses, dada a escassez da oferta internacional”, a campanha nacional de imunização pode parar.
A carta do ministério foi enviada pelo secretário-executivo da Saúde, Elcio Franco, na segunda-feira, 8, ao embaixador chinês no Brasil, Yang Wanming. O “número 2” do ministro Pazuello pede para “averiguar a possibilidade” da compra de doses da BBIBP-CorV, vacina de eficácia média de 79%. Além disso, afirma que o ideal seria a entrega do produto ainda neste semestre, com possibilidade da contratação de mais doses para o resto do ano.
“A principal estratégia brasileira para conter a pandemia e, em particular, essa variante P1 é intensificar a vacinação. Até a presente data, já foram vacinadas mais de 9 milhões de pessoas. A campanha nacional de imunização, contudo, corre risco de ser interrompida por falta de doses, dada a escassez da oferta internacional. Por conta disso, o Ministério da Saúde vem buscando estabelecer contato com novos fornecedores, em especial a Sinopharm, cuja vacina é de comprovada eficácia contra a Covid-19”, escreve o secretário.
Franco também disse ao embaixador que a variante brasileira da covid-19 tem rapidamente levado pacientes a quadros graves. “O Ministério da Saúde está ciente da importância de conter essa cepa e de impedir que se espalhe pelo mundo, recrudescendo a pandemia”, declara.
Sob críticas por minimizar a pandemia e pouco se esforçar pela compra de vacinas, o presidente Bolsonaro passou a demonstrar maior interesse em aumentar a oferta de imunizantes. Ele chegou a elogiar a Pfizer, em reunião com a empresa na segunda-feira, 8, após rejeitar por meses as ofertas da farmacêutica. O governo, agora, espera fechar a compra de 100 milhões de doses da Pfizer.
A postura contrasta com declarações de Bolsonaro durante a pandemia. Ele já afirmou que não compraria doses da Coronavac, desenvolvida na China, devido a sua “origem”. Disse ainda, em dezembro, que a pressa pela chegada dos imunizantes “não se justifica” e que as farmacêuticas é que deveriam estar interessadas em negociar com o governo. “Pessoal diz que eu tenho que ir atrás. Não, quem quer vender (que tem). Se sou vendedor, eu quero apresentar”, disse Bolsonaro em 28 de dezembro.
Já Pazuello minimizou em diversas declarações a demora para a compra de vacinas. Em 21 de janeiro, o general disse que o governo receberia uma “avalanche de propostas”. “Em janeiro, agora, e começo de fevereiro, vai ser uma avalanche de laboratórios apresentando suas propostas. A gente tem de estar com muita atenção e cuidado, para colocar todas elas o mais rápido possível disponíveis, dentro da segurança e eficácia”, disse Pazuello. Nos bastidores, ele chegou a desdenhar de ofertas da Pfizer que, segundo ele, não serviriam nem para imunizar Brasília nos primeiros meses.
O governo, porém, tem reduzido as expectativas de entrega de vacinas. No sábado, a pasta mudou a previsão de distribuição em março de 38 milhões para 30 milhões de doses. A lista exclui os imunizantes Covaxin, produzidos pelo laboratório indiano Bharat Biotech, que ainda não pediu sequer autorização para uso emergencial à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Além disso, Fiocruz e Butantan tiveram de adiar a entrega de alguns lotes por atraso no recebimento de insumo farmacêutico ativo (IFA) para a produção. O produto vem da China.
(Estadão Conteúdo)