O presidente da Gasmar (Companhia Maranhense de Gás Natural) e professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Allan Kardec, destacou a importância que os ganhos financeiros, a partir da exploração de petróleo, trariam para as regiões Norte e Nordeste: “O Amapá é pobre, precisa de recursos”.
Para ele, que foi diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) entre 2008 e 2012, esses recursos são necessários inclusive para a própria preservação ambiental. A seguir os principais pontos da entrevista do especialista ao Valor Econômico:
Direito de fala
Queremos, antes de tudo, ter direito de fala. O que estão fazendo agora é decidir em Brasília os destinos de pessoas que estão longe. A comunidade acadêmica está completamente ausente desse debate. Como alguém sentado em uma cadeira no Leblon quer decidir o destino do Amapá? Muita gente nem sabe onde fica o Amapá ou o Maranhão. Há um desconhecimento gigantesco. O próprio nome de Foz do Amazonas não foi bem dado. Nós do arco norte não pedimos que outros nos representem. Queremos ser ouvidos por nós mesmos. Não queremos que outras vozes falem por nós.
Pobreza da região
Precisamos de um debate racional e queremos o direito de explorar. Nosso povo é pobre. O Amapá é belíssimo, mas 60% da população do Estado vive de auxílio. Para efeitos de comparação, em 2022, o Amapá registrou um PIB [Produto Interno Bruto] de R$ 17 bilhões. No mesmo ano, o Rio de Janeiro recebeu R$ 50 bilhões em royalties e participações das atividades de petróleo e gás natural. O Estado [do Amapá] é pobre, precisa de recursos. O Brasil precisa de recursos para aplicar em educação e em saúde.
Debate científico
O debate precisa ser científico, além de técnico. Precisamos de uma discussão racional. Queremos o direito de explorar. A Rede Amazônia Azul é um grupo de cientistas que tem estudado o tema e está elaborando agora estimativas de petróleo da bacia da Foz do Amazonas. O grupo é composto por representantes da UNIFAP, UFMA, UFPA, UFF, UFRJ, UEMA, UERN, UFJF, UFES, REMANOR, UNIVALI e TAMAR, entidades locais e outras com tradição na área. O ponto principal dessa conversa agora é sobre a AAAS [Avaliação Ambiental de Área Sedimentar]. Esse documento foi baseado em outras regulações do mesmo tipo que já são praticadas há anos no Reino Unido e nos Estados Unidos. Em ambos os casos é o governo quem realiza os estudos de viabilidade da exploração. É o governo que tem a obrigação de equilibrar as próprias prioridades e atender as necessidades de energia. Não é algo desgarrado do Estado. É para servir aos contribuintes. As AAAS não têm caráter vinculante, portanto, suas recomendações não são obrigatórias nos processos de licenciamento, o que, aparentemente, está sendo demandado como obrigação da operadora Petrobras. Não há casos similares, nos países citados, de obrigatoriedade de empresas, ou seja, agentes fora da esfera pública serem demandados a cumprirem tarefas que são essencialmente do Estado e, especificamente, do órgão ambiental. Os próprios despachos de abril [2023] do Ibama diziam que as restrições ambientais teriam que ser apresentadas em manifestação conjunta do MME e do Ministério do Meio Ambiente na realização da 11a rodada de licitação da ANP, em 2012. A Petrobras não tem fundamento legal para entregar AAAS. Nem nos países que inspiraram esse documento, nem na portaria dos ministérios, nem no despacho do Ibama se prevê que a operadora o elabore. Se o debate for científico, fica mais claro pra todo mundo.
Preservação ambiental
Nós reconhecemos que a exploração precisa ser feita de forma sustentável, mas o nosso grande argumento é que o Brasil tem a matriz energética mais limpa do planeta. Nós temos muito espaço para fazer compensação ambiental. Existe uma propaganda de que os lugares onde o petróleo e a Petrobras entram apresentam uma degradação. É o contrário. Existem vários projetos de preservação ambiental, como o Projeto Tamar, das tartarugas marinhas, que são bancados pela Petrobras. Precisamos de dinheiro para fazer a preservação ambiental. Se não for assim, vamos ficar dependentes de estrangeiros para explorar a Amazônia. Precisamos de recursos para ter soberania. Sobre o outro argumento que mencionam acerca da possibilidade de acidente ambiental, é importante lembrar que no Brasil nunca houve vazamento de petróleo em fase de exploração. O poço fica na fronteira com a Guiana, a cerca de 530 quilômetros da própria foz. É mais longe que a distância entre Londres e Paris. Fora que as correntes marítimas na região também impedem que qualquer vazamento chegue até a foz.
Povos originários
Não é verdade quando dizem que os povos originários estão contrários à exploração. Vimos indígenas falando que apoiam a exploração porque quando é feita de uma forma sustentável traz recursos. Fizemos uma audiência pública em Oiapoque na sexta-feira (19) em que tivemos a participação de grupos indígenas e representantes dos governos do Maranhão, do Pará, do Amapá, da Guiana, especialistas, pesquisadores. (KL – Valor)