O juiz Douglas de Melo Martins (Vara de Interesses Difusos e Coletivos da Ilha de São Luís), concedeu pedido judicial do Estado do Maranhão reconhecendo o dever de estabelecimento de negociações a fim de garantir a continuidade do contrato firmado com o Bank of America Merril Lynch, para o fornecimento de crédito no valor de US$ 661.967.121,34 ao governo estadual.
Conforme a decisão, além de abrir negociações, o banco deverá evitar de declarar o inadimplemento do Estado do Maranhão no contrato, pelo prazo de 12 meses, a contar da data do vencimento da próxima parcela (23/07/2020) e, até o término desse prazo, dar início ao procedimento de renegociação do contrato.
No prazo de 15 dias, as partes devem apresentar suas propostas, iniciando pelo Estado do Maranhão. O juiz marcou o dia 22 de junho, às 9h, uma audiência de conciliação, por meio de videoconferência, para a discussão da viabilidade de acordo.
O contrato firmado em 23/07/2013, entre o Estado do Maranhão e o BANK OF AMERICA MERRIL LYNCH, tem como contrapartida o pagamento do montante sob taxa de juros de juros de 4,61% ao ano, mais a variação cambial, com pagamentos semestrais, carência de 18 meses e pagamento total em 10 anos. O contrato foi garantido pela União Federal e os recursos foram utilizados para o pagamento de dívida com esta, contraídas em razão das Leis Federais nº 8.727, de 5 de novembro de 1993 e nº 9.496, de 11 de setembro de 1997. Em contragarantia, a União teve vinculadas, em seu favor, as receitas tributárias próprias do Estado do Maranhão relativas a ITCMD, ICMS, IPVA e IRPF e as receitas decorrentes das transferências constitucionais obrigatórias consignadas no Fundo de Participações dos Estados.
Pedido – O pedido do Estado do Maranhão foi formulado alegando a boa-fé objetiva (colaboração, manutenção do contrato, cooperação, entre outros) para que fosse concedida tutela de urgência a fim de impedir o demandado de declarar um evento de inadimplemento durante um prazo a ser determinado pelo juízo, não inferior a seis meses, e a contar da data do vencimento da próxima parcela (23/07/2020), durante o qual deve dar início a procedimento de negociação, evitando a execução da garantia contratual perante a União.
O caso de eventual inadimplemento, ou atraso de uma das prestações, poderá resultar no vencimento antecipado de toda a dívida e a execução do crédito perante a co-devedora. Em contrapartida, esta poderá executar as garantias no valor total do montante devido, requerendo o crédito decorrente das receitas próprias vinculadas (tributos estaduais), bem como bloqueando os repasses devidos ao Estado do Maranhão por meio do Fundo de Participação dos Estados.
Do início do contrato até o corrente ano, o Estado do Maranhão pagou o montante de R$ 1.831.817.524,19 restando, ainda o saldo devedor de 1.895.954.923,90. Conforme o calendário de pagamentos, o Estado do Maranhão realiza o adimplemento de duas prestações a cada ano. A primeira prestação do ano de 2020 tem vencimento estipulado para 23/01 e a segunda para 23/07. O saldo devedor do contrato hoje está em US$ 370.977.542,00, o equivalente a cerca de R$ 1,9 bilhão.
O Estado do Maranhão alegou que a conjuntura econômica atual – queda das taxas de juros, valorização excessiva da moeda norte-americana, crise econômica e crise fiscal – tornam excessivamente oneroso o depósito da parcela aprazada para o mês de julho/2020 Alegou ainda que a recente pandemia do coronavírus “exacerbou dramaticamente a valorização da moeda norte-americana e, de outro, contaminou as atividades sociais e econômica, com reflexos tanto no aumento do dispêndio público quanto na diminuição da arrecadação”.
Enfatizou também que “não objetiva, por nenhum modo, deixar de honrar a dívida. Requer somente seja possibilitada a renegociação dos termos do contrato e a readequação de suas cláusulas geradoras de onerosidade excessiva, como expressão dos deveres anexos à boa-fé contratual, com expressão normativa no art. 113, § 1º, incs. II a V do Código Civil e art. 6º, inc. V, do Código de Defesa do Consumidor”.
Arrecadação – Conforme nota técnica emitida pela Secretaria de Estado de Planejamento e Orçamento, o Estado do Maranhão estima a diminuição de receitas na ordem de 20% de todo o orçamento do Estado, em valor aproximado de R$ 2.333.639.260,24. Além disso, a moeda norte-americana continua em ascensão e, tendo alcançado patamar de R$ 5,28.
De acordo com a decisão, o Estado do Maranhão comprovou, por documentos, que informou ao réu a impossibilidade de adimplemento da próxima parcela do contrato, denunciando um desequilíbrio contratual e solicitou a abertura de procedimento de renegociação para revisão das bases negociais e manutenção do contrato. No entanto não houve resposta do réu.
“Toda esta situação evidencia a urgência e reforça o perigo de dano, a que estão submetidas as finanças do Ente Federativo, uma vez que está sujeito a variação cambial que progride em situação diametralmente oposta à arrecadação. “(…) Não há dúvida, portanto, que a execução antecipada de todo saldo devedor seria devastador para as finanças públicas do Estado do Maranhão e levaria a um verdadeiro colapso na prestação dos serviços públicos, inclusive os essenciais”, declarou o juiz na decisão.
“É razoável, entretanto, entender-se que, como dever anexo decorrente da observância da boa-fé objetiva, as partes devam se submeter a um procedimento de renegociação da avença, a fim de que seja remediada a situação de desequilíbrio e revisadas as bases negociais para manutenção do contrato. Verifico, portanto, a existência de razoabilidade jurídica na pretensão do Estado do Maranhão de que o réu seja instigado a renegociar o contrato, em observância à boa-fé objetiva”, concluiu Douglas Martins.
A decisão judicial não impede que as partes, por seus representantes, mantenham tratativas extrajudiciais e comuniquem o Juízo anteriormente acerca de eventual solução consensual.