Resultado do julgamento poderia alterar a composição atual da Câmara; relator do caso, Lewandowski votou a favor da mudança, mas só a partir das eleições de 2024
O ministro Alexandre de Moraes pediu vista – mais tempo para analisar – a ação do Supremo Tribunal Federal (STF) que julga o cálculo da última fase das chamadas sobras eleitorais.
Moraes fez o pedido nesta sexta-feira (7) e tem até 90 dias para devolver o caso. Depois do prazo, o processo fica liberado para julgamento. Ainda é preciso que a presidente da Corte, ministra Rosa Weber, paute as ações.
Até o momento, só havia o voto do relator, ministro Ricardo Lewandowski. Ele votou de forma favorável aos pedidos ajuizadas por partidos e entendeu que o cálculo da última fase das chamadas sobras eleitorais deve ser mudado para levar em conta todas as siglas em disputa na eleição proporcional.
Essa posição teria o potencial de mudar a composição da Câmara dos Deputados em ao menos sete cadeiras. O ministro, no entanto, entendeu que a mudança deve valer a partir das eleições de 2024, quando serão definidos prefeitos e vereadores nos municípios brasileiros.
O caso está em análise no plenário virtual do STF. No formato, os ministros depositam seus votos em um sistema eletrônico da Corte. O julgamento começou à meia noite desta sexta-feira (7), e vai até 17 de abril. Até essa data, os ministros que quiserem ainda podem depositar seus votos, mesmo depois do pedido de vista.
O julgamento das sobras deve ser um dos últimos com a participação de Lewandowski, que vai se aposentar do Supremo em 11 de abril.
Como as ações das sobras eleitorais estão sendo julgadas em meio eletrônico, o voto de Lewandowski fica mantido para contabilização do placar final de julgamento. Seu voto será preservado mesmo com o pedido de vista de Moraes, e isso também acontecerá caso algum ministro peça destaque (que manda o caso para o plenário físico).
As ações questionam mudanças no Código Eleitoral que alteraram as regras de distribuição das sobras eleitorais, além de trecho de uma resolução do TSE sobre o mesmo tema.
A norma estabeleceu que só podem concorrer a vagas da última fase da distribuição das sobras os partidos que atingiram ao menos 80% do quociente eleitoral.
Lewandowski votou para mudanças só em 2024
Para Lewandowski, a barreira de 80% para preenchimento de cadeiras que sobrarem na última fase de distribuição de vagas “não se mostra compatível com a letra e o espírito do texto constitucional, pois dessa fase deveriam participar todas as agremiações que obtiveram votos no pleito”.
A regra se aplica às eleições proporcionais, que define escolha de deputados estaduais, distritais, federais e vereadores.
O magistrado citou esse filtro como uma espécie de obstáculo ao pluralismo político e passível de desprezar votos dos eleitores, ao viabilizar a eleição de candidato menos votado desde que o partido tenha atingido o percentual mínimo.
“Com efeito, toda e qualquer norma que tenha por escopo restringir a pluralidade dos partidos políticos, limitando a eleição de seus representantes, notadamente no sistema proporcional, viola os fundamentos de nosso Estado Democrático de Direito”, declarou.
“Considero, no ponto, ser inaceitável que o Supremo Tribunal Federal chancele interpretação da norma que permita tamanho desprezo ao voto, mormente em favor de candidato com baixíssima representatividade e, conforme os critérios empregados na segunda fase, pertence à agremiação já favorecida pela atual forma de cálculo”.
Em seu voto, o ministro também entendeu inconstitucional outro trecho do Código Eleitoral que disciplina a eleição de deputados e vereadores caso nenhum partido atinja o quociente eleitoral. Conforme a norma, caso isso aconteça, serão eleitos os candidatos mais votados.
Para Lewandowski, esse dispositivo “configura um modo subreptício e flagrantemente inconstitucional de implantar um sistema majoritário, semelhante ao conhecido ‘distritão’”.
O ministro propôs que, caso nenhum partido atinja o quociente eleitoral, se apliquem as regras da segunda e terceira fases da distribuição de cadeiras.
Uma das ações de inconstitucionalidade foi apresentada pelo partido Rede Sustentabilidade, outra pelo Podemos e PSB, e a última pelo PP — mesmo partido do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que se reuniu com o ministro Lewandowski em março para tratar do assunto.
Como a CNN mostrou, o presidente da Câmara teria alegado ser ruim para a democracia e para a Casa impedir que parlamentares que já estão trabalhando na atual Legislatura percam o cargo para quem não estava no início da legislatura.
Havia dúvida de partidos sobre o real impacto de uma decisão favorável à mudança no cálculo das sobras.
Entenda o quociente eleitoral e as sobras de cadeiras
A discussão dos mandatos dos deputados se dá no chamado sistema proporcional, que é o responsável por definir a eleição de deputados estaduais, federais e distritais e vereadores.
O sistema proporcional não leva em conta só a quantidade absoluta de votos que um determinado candidato recebeu para determinar quem será o eleito. O voto do eleitor é contabilizado à uma agremiação, seja partido ou federação.
Para definir qual deputado ou vereador será eleito, é preciso fazer duas contas. O quociente eleitoral, que define o número de votos um partido precisa para conseguir eleger pelo menos um deputado; e o quociente partidário, que define quantas cadeiras cada partido terá direito de ocupar em determinada Casa Legislativa.
Quociente eleitoral: o total de votos válidos é dividido pelo número de vagas em disputa
Quociente partidário: o número de votos de cada partido ou federação é dividido pelo quociente eleitoral
Ocorre que nem sempre todas as cadeiras são preenchidas só com esses critérios. Isso porque nem todas as siglas atingem o quociente eleitoral. Aí entram as sobras.
As vagas das sobras só podem ser disputadas por partidos que conseguiram ao menos 80% do quociente eleitoral.
Para candidatos, há um mínimo de votos de 20% do quociente eleitoral que precisam ter obtido nas eleições para disputar as sobras.
A votação de cada agremiação é dividida pelo número de cadeiras obtidas na fase anterior mais um. O partido ou federação que tiver a maior média, elege o candidato.
Caso ainda sobrem cadeiras a preencher, a última fase de distribuição considera os partidos que tiverem as maiores médias, sem a restrição a candidatos que não atingiram votação individual mínima.
É essa última fase de distribuição é a que está sendo questionada. Os partidos pedem ao STF que todas as siglas possam participar da última fase.
A resolução do TSE sobre o tema entendeu que só os partidos que obtiveram ao menos 80% do quociente eleitoral podem participar. (Com Uol).