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Ao fazer uma performance erótica em evento na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), a historiadora da arte e cantora travesti Tertuliana Lustosa se tornou o principal assunto entre perfis da direita nas redes sociais.

Levantamento do GLOBO localizou ao menos 12 posts de grande repercussão feitos por políticos sobre o tema. Apenas as postagens originais tiveram 1,5 milhão de visualizações no X, segundo dado público da plataforma.

O episódio que se tornou o foco das redes sociais de parlamentares ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ocorreu na última quinta-feira durante uma palestra do seminário “Dissidências de gênero e sexualidades”, organizado pelo Grupo de Pesquisa Epistemologia da Antropologia, Etnologia e Política (Gaep).

Na ocasião, a historiadora cantou um brega funk de sua autoria, “Educando com o C*”, enquanto dançava para os presentes. Ela chega a mostrar os glúteos para a plateia em vídeo que logo viralizou.

Em nota, a universidade disse estar averiguando o ocorrido e que tomará providências assim que todos os envolvidos forem ouvidos.

A cena gerou grande repercussão a partir de críticas impulsionadas por políticos como os deputados do PL Nikolas Ferreira (MG) e Gustavo Gayer (GO).

MAIOR ENGAJAMENTO

A publicação de maior engajamento foi feita por Nikolas, alcançando 780,2 mil pessoas.

O parlamentar descreveu o episódio e pediu punição para os responsáveis.

“Diante destes fatos, solicitarei informações dos professores responsáveis pelo grupo de pesquisa, que realizou encontro. Se as apurações demonstrarem ciência e leniência quanto ao fato, solicitarei a exoneração de todos”, escreveu o deputado, que preside a Comissão de Educação da Câmara.

Já Gayer critica, em vídeo, a performance em um espaço de ensino federal:

— Isso é muito revoltante. Você trabalha 12,14, 16 horas por dia durante anos para poder dar uma vida melhor para os seus filhos. Ele faz o Enem, passa numa faculdade federal, entra na sala e é exposto a isso.

Outro político que mobilizou as redes com postagens sobre o tema foi o ex-deputado e ex-procurador da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol.

Em dois posts, Deltan alcançou mais de 800 mil visualizações. Além de criticar o ato em uma instituição pública, ele aproveitou a ocasião para alfinetar o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF).

“Não é à toa que o Maranhão, estado que foi governado por 8 anos pelo agora ministro do Supremo Flávio Dino, tem uma das menores rendas per capita do Brasil e há anos apresenta um dos piores desempenhos nos rankings de educação”, afirmou.

A movimentação foi acompanhada por outros integrantes da direita como a deputada Júlia Zanatta (PL-SC), o presidente do Novo, Eduardo Ribeiro, e a vereadora de São Paulo Janaina Lima (PP).

Até mesmo perfis da esquerda, de fora da política, condenaram a ação.

“Essa vulgarização gratuita do ambiente acadêmico só contribui para enfraquecer a reputação da universidade pública perante a sociedade”, escreveu Lucas Paulino, que se classifica como “progressista” em sua biografia no X.

Essa postagem foi a mais relevante desse campo, tendo alcançado cerca de 400 mil visualizações.

O tema extrapolou as redes sociais e virou pauta na Câmara.

Até o momento, foram apresentados nove requerimentos e uma proposta de projeto de lei.

Esta último é de Nikolas e prevê o agravamento de punições para atos obscenos, quando realizados dentro de instituições de ensino.

Já os requerimentos pedem esclarecimentos do Ministério de Educação e as convocações do ministro Camilo Santana e do reitor da UFMA, Fernando Carvalho Silva.

As universidades federais têm autonomia prevista na Constituição.

Esta não é a primeira vez que uma situação como esta mobiliza parlamentares contra o governo federal.

Em outubro passado, a apresentação de uma mulher ao som de “Batcu”, de Aretuza Lovi, durante o 1° Encontro de Mobilização da Promoção da Saúde, do Ministério da Saúde, gerou efeito similar.

— É neste tipo de situação que a direita encontra munição para propagar sua agenda ideológica, com ampla articulação da base para disseminar este conteúdo — diz a pesquisadora Letícia Capone do Grupo de Pesquisa em Comunicação, Internet e Política da PUC-Rio.

Em fevereiro, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, suspendeu uma nota técnica que derrubava prazo para o aborto legal, após repercussão negativa entre opositores do governo.

A nota derrubava uma orientação da gestão Bolsonaro que fixava o prazo de 21 semanas e 6 dias de gestação para a prática do aborto nos casos em que é legal.

Ao contrário do que foi veiculado nas redes, a nota do ministério não ampliava as circunstâncias em que o aborto é permitido por lei, mas reforçava o que já é previsto no Código Penal de 1940, que não limita tempo de gestação para o aborto legal.

*Por Luísa Marzullo (O Globo)

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