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Em 1997, quando era número dois no Ministério da Fazenda do México, o economista Santiago Levy decidiu mudar a política de combate à pobreza extrema.

Em vez de conceder subsídios a alimentos para tentar acabar com a fome — medida de eficácia insatisfatória —, apostou na transferência de renda.

Em troca de dinheiro, os pais teriam de manter os filhos na escola e fazer visitas periódicas a centros de saúde.

Dois anos depois, o Progresa cobria 40% das famílias em áreas rurais. Foi o primeiro programa nacional do gênero em país emergente e inspiração para o Bolsa Família.

Desde o início, iniciativas de transferência de renda foram alvo de críticas.

Uma das principais dúvidas era se ajudavam a quebrar a cadeia de transmissão da miséria de pai para filho ou se apenas criavam um mecanismo de dependência, aliviando a pobreza, mas sem reduzi-la.

Em estudo recente, pesquisadores do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social, da Oppen Social, do Ministério da Saúde, da Fundação Getulio Vargas, da PUC-Rio e da Universidade Bacconi, na Itália, concluíram que tais programas promovem mobilidade social.

Os pesquisadores identificaram crianças entre 7 e 16 anos que faziam parte do Bolsa Família em dezembro de 2005, a primeira geração do programa.

Mais de dez anos depois, já adultos, 64% não constavam como beneficiários de programas sociais do governo federal, e 45% tinham conseguido emprego com carteira assinada entre 2015 e 2019.

Metade desses se manteve no mercado formal por três ou mais anos. Embora ocupassem vagas com remuneração baixa, estavam em situação melhor que os pais.

Os próprios pesquisadores afirmam ter se surpreendido com o resultado em apenas uma geração.

É evidente que o Bolsa Família não pode ser considerado o único motivo para a transformação, influenciada por fatores como situação econômica ou desenvolvimento regional.

Mas seu efeito foi inequívoco. E olhar o passado do programa ajuda a pensar nos desafios futuros.

Regiões com melhores escolas, atenção médica e dinamismo econômico registraram os resultados mais positivos.

“Um residente em municípios das regiões Norte e Nordeste tem metade da probabilidade de mobilidade social quando comparado a residentes das regiões Sul e Sudeste”, dizem os pesquisadores.

No Sul, 74% saíram dos programas sociais, parcela comparável às de Centro-Oeste (72%) e Sudeste (70%), mas distante de Norte (61%) e Nordeste (58%).

Estas duas registraram as menores fatias com empregos formais — 30% e 37%, respectivamente.

No Sul foram 60%, e no Sudeste 55%. A pesquisa também descobriu diferenças significativas de gênero e cor.

Homens brancos e mais velhos têm mais chance de escapar da pobreza extrema.

Mesmo com limitações e a invariável exploração política, o Bolsa Família tem se revelado um instrumento poderoso de transformação.

Não apenas no curto prazo, ao combater a fome dos mais vulneráveis, mas no médio e longo, ao mudar a história familiar.

Para seguir assim, é crucial reforçar as condições impostas aos beneficiários, como frequência escolar dos filhos, foco apenas nos mais necessitados e saída de quem não precisar mais do programa.

Concomitantemente, é preciso acelerar melhorias na educação e o dinamismo econômico em localidades com baixo crescimento. Sem isso, a transformação será lenta. O Bolsa Família pode muito, mas não pode tudo

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