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Na primeira entrevista exclusiva desde o começo do governo, concedida à jornalista Natuza Nery, da Globo News, nessa quarta-feira, 18, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que acredita que invasão do Planalto foi facilitada e defendeu condenação dos responsáveis pelos atos de vandalismo, que chamou de ‘golpistas’.

Erros do serviço de inteligência – O presidente afirmou que houve um “erro” dos serviços de inteligência do país, que não o alertaram sobre a possibilidade dos atos de vandalismo.

Disse Lula que a inteligência do governo nas vésperas do ataque “não existiu”, e que o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e as Forças Armadas não serviram para alertá-lo sobre o que poderia ocorrer na capital federal.
Lula contou que na sexta-feira, 6, viajou a São Paulo e que, àquela altura, tinha a informação de que estava “tudo tranquilo” em Brasília; que havia somente 150 pessoas no acampamento montado em frente ao Quartel-General do Exército.

“Nós temos inteligência do GSI, da Abin, do Exército, da Marinha, da Aeronáutica, ou seja, a verdade é que nenhuma dessas inteligências serviu para avisar ao presidente da República que poderia ter acontecido isso. Se eu soubesse na sexta-feira que viriam 8 mil pessoas aqui, eu não teria saído de Brasília. Eu saí porque estava tudo tranquilo”, afirmou Lula.
Após os ataques na Praça dos Três Poderes, Lula disse que soube que os atos estavam sendo convocados “há mais de uma semana” pelas redes sociais.

“A minha inteligência não existiu” – “Não foi nenhum analfabeto político que invadiu isso aqui. Era gente que preparou isso durante muito tempo. Eles não tiveram coragem de fazer nada durante a posse. Na verdade, nós cometemos um erro, eu diria elementar: a minha inteligência não existiu. Eu saí daqui na sexta-feira com a informação que tinham 150 pessoas no acampamento, que tava tudo tranquilo, que não iriam permitir que entrasse mais ônibus, que não iriam permitir que juntasse mais ninguém. Eu viajei para São Paulo na maior tranquilidade. E aconteceu o que aconteceu”, disse Lula.

Lula disse que seu serviço de inteligência “não existiu” e, ainda, que todos os militares que participaram dos “atos golpistas” de 8 de janeiro, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, serão punidos.

Impressão de começo de um golpe – Luiz Inácio Lula da Silva disse ter tido a “impressão” de que os atos registrados em Brasília eram “o começo de um golpe de estado. Eu fiquei com a impressão, inclusive, que o pessoal estava acatando ordem e orientação que o Bolsonaro deu durante muito tempo. Muito tempo ele mandou invadir a Suprema Corte, muito tempo ele desacreditou do Congresso Nacional, muito tempo ele pedia que o povo andasse armado, que isso era democracia”, ressaltou.

No dia 8 de janeiro, bolsonaristas radicais invadiram e depredaram o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF). Mais de mil e trezentas pessoas foram presas suspeitas de envolvimento nos atos.

“Eles entraram porque a porta estava aberta” – Assim que ficou sabendo da invasão, Lula disse que ligou para o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Gonçalves Dias, perguntando onde estavam os soldados.
“Eu não via soldado. Eu só via gente entrando. Eu não via soldado reagindo, não via soldado reagindo. Sabe? E ele dizia que tinha chamado soldado, que tinha chamado soldado. Ou seja, e esses soldados não apareciam. Eu fui ficando irritado porque não era possível a facilidade com que as pessoas invadiram o palácio do presidente da República.”
Lula afirmou que os vândalos não quebraram os vidros do Palácio do Planalto para entrar na sede do Poder Executivo. “Eles entraram porque a porta estava aberta. Alguém de dentro do palácio abriu a porta para eles, só pode ter sido. Houve conivência de alguém que estava aqui dentro”.

“Todos serão punidos, não importa a patente” – Rdeferindo-se aos militares, Lula disse que “todos que participaram do ato golpista serão punidos. Todos. Não importa a patente, não importa a força que ele participe. Terão que ser afastados das suas funções e vão responder perante a lei”, disse o presidente.
Lula foi questionado sobre se está disposto a abrir um novo capítulo na relação com os militares, apesar dos ataques de vandalismo e dos acampamentos que ficaram em frente a quartéis-generais do Exército.
Não politizar’ – Lula também disse que é preciso ‘não politizar’ as Forças Armadas. “O soldado, o coronel, o sargento, o tenente, o general, ele tem direito de voto, ele tem direito de escolher quem ele quiser para votar. Agora, como ele é um cargo de carreira, ele defende o estado brasileiro. Ele não é Exército do Lula, ele não é do Bolsonaro, não foi do Collor, não foi do Fernando Henrique Cardoso”, afirmou o presidente.
O presidente acrescentou que as instituições não precisam ter partido nem candidato.
“A Suprema Corte não é do Lula. Essas instituições que dão garantia a esse país não precisam ter partido e não precisam ter candidato; têm que defender o estado brasileiro e defender a Constituição. E eu quero conversar com eles abertamente. porque, da mesma forma que eu escolhi eles, quando eu escolhi, teve critério para escolher”, completou Lula.

Relatou o presidente, na entrevista, que conversou com o ministro da Justiça, Flávio Dino, e que nessa conversa lhe foi proposto fazer uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

As operações de GLO são adotadas em situações graves de perturbação da ordem em que se esgotam as possibilidades de ação das forças tradicionais de segurança pública dos estados. Neste caso, essas ações são executadas pelas Forças Armadas. As GLOs são realizadas exclusivamente por ordem da Presidência da República.
No entanto, Lula optou por fazer uma intervenção federal na segurança pública do Distrito Federal, nomeando o secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública Ricardo Cappelli.
“Quando fizeram GLO no Rio de Janeiro, o Pezão, que era governador, virou rainha da Inglaterra. Eu tinha acabado de ser eleito presidente da República. […] E eu não ia abrir mão de cumprir com as minhas funções e exercer o poder na sua plenitude”, observou.

O presidente afirmou ainda que, após a intervenção na Polícia Militar do DF, a operação para retomar o controle das sedes dos Três Poderes começou a surtir efeito.

As atitudes de Bolsonaro – Lula elencou atitudes do ex-presidente que o levaram a acreditar que os extremistas radicais estavam seguindo orientações de Bolsonaro. O petista citou, inclusive, a ida de Bolsonaro para Miami antes do fim do governo.
“A decisão dele de ficar quieto depois de perder as eleições, semanas e semanas sem falar nada; a decisão dele de não passar a faixa para mim; de ir embora para Miami como se estivesse fugindo com medo de alguma coisa, e o silêncio dele, mesmo depois dos acontecimentos daqui, me dava a impressão de que ele sabia de tudo o que estava acontecendo, que ele tinha muito a ver com aquilo que estava acontecendo”, disse.

“Obviamente que quem vai provar isso são as investigações. Mas a impressão que me deixava era essa. Possivelmente esse Bolsonaro estivesse esperando voltar para o Brasil na glória de um golpe. Sabe? E eu, então, não podia permitir GLO. Eu tinha que tomar a decisão política e tomamos a decisão certa”, continuou.
Para Lula, a tentativa de golpe de Estado não vingou por causa das reações dos Três Poderes e dos governadores. O presidente disse que houve uma união para “garantir a democracia brasileira”, o que fez com que os radicais não avançassem com a tentativa de golpe.
No entanto, o presidente acredita que “gente profissional” estava envolvida com os ataques terroristas na capital federal.
“O dado concreto é que segundo todo depoimento, as pessoas que vieram aqui eram profissionais. As pessoas que vieram aqui conheciam o Planalto, conheciam a Câmara, conheciam o Judiciário”.