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Dados inéditos do Exército obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação revelam que o governo Bolsonaro liberou, em média, 691 registros de novas armas por dia para grupo formado por caçadores, atiradores e colecionadores (CACs), nos quatro anos do mandato do ex-presidente. Foram ao todo 904.858 registros para aquisição de armas entre 2019 e 2022, conforme divulgação feita pelo Portal G1, nesta quinta-feira, 19.
Esta é a primeira vez que é divulgado o total de novas armas liberadas por Bolsonaro em todo o seu mandato, desde a posse, em 1º de janeiro de 2019, até dezembro de 2022. O ex-presidente tinha entre suas principais pautas o armamento da população. Os registros representam a liberação de 26 novas armas por hora no país nos últimos quatro anos.
O número de pessoas com certificado de CAC deu um salto no governo Bolsonaro. Cresceu 474%, segundo dados do Anuário de Segurança Pública, que considera licenças para atividades de caçador, atirador desportivo e colecionador concedidas até 1º de julho de 2022. O número de pessoas com registro de CAC passou de 117,5 mil em 2018, antes de Bolsonaro assumir, para 673,8 mil.

Aumento constante – O ano passado concentrou a maior quantidade de novas armas liberadas: 431.131, ou 47% do total. Houve crescimento constante desde 2019, quando ocorreram 78.335 liberações. Em 2020, foram 137.851, e em 2021, o número passou para 257.541. Foram 904.858 novas armas para caçadores, atiradores e colecionadores, de 2019 até 2022.

Crescimento de 625% – O último ano do governo Bolsonaro representa crescimento de 625% quando comparado com 2018, último ano do governo de Michel Temer (MDB), seu antecessor, quando CACs receberam autorização para adquirir 59.439 novas armas.
Em seu mandato, Bolsonaro editou decretos que facilitaram o acesso a armas, inclusive as de grosso calibre e uso restrito, como fuzis, com critérios menos rígidos para posse e aquisição, bem como maior limite de munições disponíveis por ano para CACs.
Os decretos foram parcialmente suspensos pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em setembro de 2022. No dia 2 de janeiro, o presidente Lula (PT) revogou as normas sobre armas e definiu novas regras, dentre as quais a suspensão de novas concessões para CACs registrarem novas armas.
Aumento da procura – Um dos motivos para a alta procura por armas no governo Bolsonaro é a facilitação do acesso e registro das armas. Diretor do Instituto Sou da Paz, especializado em segurança pública, Bruno Langeani conta que o instituto acompanha a categoria de CACs desde os anos 1990 e que esse era um grupo “muito residual, de pouquíssimas pessoas”.
“Demoramos décadas para essa categoria ter 100 mil armas e, em um período muito curto, vimos esse número explodir. Hoje já ultrapassou mais de um milhão de armas na categoria, a maior parte nestes quatro anos”, afirmou.

Violência política crescente – Langeani alertou que o grande número de armas que entraram em circulação recentemente representa risco num contexto de violência política crescente, com ações de bolsonaristas cada vez mais radicalizados. Além disso, há esquemas fraudulentos envolvendo a emissão de licenças para desviar armas compradas no mercado legal ao crime organizado.
“Vemos a violência política alimentada por armas registradas oficialmente no Exército. E houve explosão no esquema criminoso de fornecimento de armas, ou para milícias ou para grupos que atuam no estilo do novo cangaço [quadrilhas especializadas em roubos a banco], que compram armas mais baratas e com documento”, afirmou.
Um levantamento do Instituto Sou da Paz divulgado pelo Fantástico há quase ano mostrou que uma grande quantidade de armas compradas no mercado legal vai parar nas mãos de bandidos.

Ironias – Em outubro de 2021, ironizando Lula, Bolsonaro disse que as pessoas que faziam comparações entre a ampliação do acesso ao porte de armas e a fome deveriam dar “um tiro de feijão” ao ter a casa invadida por alguém. “Vocês sabiam que Santa Catarina é o Estado que tem menor percentual de mortos por 1 milhão de habitantes e é o mais armado? Quanto mais arma, menos violência. O Lula disse que ele vai desarmar o povo. Inclusive, a esquerda fala que a gente não come arma, come feijão. Quando alguém invadir a sua casa, dê tiro de feijão”, debochou, na época.