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Viajar em avião será mais complicado, mais demorado e até 50% mais caro, na esteira da pandemia, sinalizam analistas e a Associação Internacional do Transporte Aéreo (Iata).

Quando os países reabrirem as fronteiras, a demanda será baixa nos primeiros meses, a competição acirrada e alguns preços poderão ser baixos. Mas logo as restrições sobre número de assentos e utilização da aeronave vão aumentar os custos e, em consequência, o preço da passagem para se chegar ao “breakeven” (ponto de equilíbrio).

As companhias serão pressionadas a manter o distanciamento social. Isso poderá obrigá-las a deixar desocupada a poltrona do meio numa fileira de três, por exemplo. A Iata luta contra essa medida, alegando que os riscos de contaminação a bordo são pequenos. Para a entidade, é essencial o passageiro cobrir o rosto com a máscara.

Em todo caso, a Iata prevê outras medidas temporárias de segurança como medir a temperatura dos passageiros, mudar os procedimentos de embarque e desembarque que reduzam o contato com a tripulação, limitar os deslocamentos do passageiro na cabine durante o voo, limpar a cabine mais frequentemente, simplificar os serviços a bordo para reduzir os deslocamento da tripulação e interação com os passageiros.

As operações de embarque e desembarque poderão assim ser duas a três vez mais demoradas, segundo analistas. O distanciamento social será aplicado também no check-in, no balcão de informação ou nas transferências para outros voos. Algumas companhias poderão exigir um informe sobre a saúde do passageiro antes do embarque. O controle nas fronteiras também será mais rígido, com os países querendo evitar futuros vírus.

Com menos assentos à venda, os custos unitários das companhias aéreas aumentarão fortemente. Nesse cenário, as tarifas aéreas deverão crescer dramaticamente de 43% a 54% em relação a 2019, conforme a região, somente para cobrir os custos, segundo a Iata.

Na América Latina, o coeficiente de ocupação de equilíbrio é de 79%. No caso de redução dos assentos, com um limite de 62% de ocupação, o preço da passagem na região terá de aumentar 50%. O custo médio de uma passagem pula de US$ 146 antes da pandemia para US$ 219 no futuro próximo na região, conforme cálculos da Iata. O custo seria 43% maior na África e Oriente Médio e 54% na Ásia-Pacífico.

“Os preços com o tempo provavelmente vão cair de novo, quando as redes globais voltarem ao normal”, diz o professor Andreas Wittmer, diretor do Instituto de Pesquisa sobre aviação na Universidade de Saint-Gall (Suíça). “Acho que esse será o caso em 1 a 3 anos depois de ter o medicamento contra a covid-19”.

Atualmente, há excesso de capacidade no mercado, globalmente. No começo do mês, 16.184 jatos estavam parados nos aeroportos, da frota global total de 29.324 aparelhos. Cerca de 20% são os grandes jatos, 14% jatos regionais, 66% os “narrowbody” jatos. Na América Latina, há 1.132 aparelhos em terra (7% do total mundial).

Para Wittmer, a atual crise é uma nova chance para uma nova consolidação no setor.

Quando o mercado abrir, as companhias vão tentar estimular a demanda em meio a forte concorrência. Atualmente, 80% dos assentos estão em rotas onde várias companhias competem. Na China, o preço da passagem caiu 40% no mercado doméstico quando o país reabriu os aeroportos. Mas a tendência é mesmo de, logo depois, uma alta no preço.

“Nos trajetos longos na primeira classe e na executiva não haverá redução de assentos, mas na classe econômica poderá haver uma redução de cerca de 50%, de forma que os preços poderão aumentar entre 30% e 50%, dependendo do mercado”, diz Wittmer.

Ele nota que a dinâmica dos preços tornará ainda possível algumas passagens baratas, “mas somente em alguns poucos assentos”.

A redução de passageiros nos aviões vai atingir em cheio o modelo “low cost”, ou baixo custo. Elas também dependem de vendas de produtos e serviços a bordo durante o voo.

Se menos passageiros estão a bordo, também haverá menos venda desses extras. Além disso, com mais tempo nos embarques e desembarques, a utilização maior das aeronaves pelas companhias de baixo custo estará comprometida.

Outros ponto a considerar é a questão ecológica. Muita gente viajava de Genebra a Roma, por exemplo, por um preço ridiculamente baixo, inferior ao custo do taxi entre o aeroporto e o centro da capital romana. Agora, com a consciência ecológica aliada aos temores do vírus, muita gente vai preferir utilizar o trem para trajetos mais curtos.

A fase de retomada das operações das companhias aéreas poderá demorar de dois a três anos, na avaliação de Edward H. Bastian, presidente do conselho de administração de Delta Airlines. O chairman da Emirate s, sheik Ahmed bin Saeed Al Maktoum, é mais otimista e calcula um prazo de 18 meses para algo parecido a uma normalização do retorno da demanda. (Assis Moreira – Valor Econômico)