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Por Pedro Maranhão

O Brasil recebeu uma grande notícia: foi aprovado pelo Congresso Nacional o PL dos Combustíveis do Futuro, que fará o país posicionar-se na fronteira do mundo civilizado, ao estabelecer meios viáveis e inteligentes de gradualmente abandonar os combustíveis fósseis, enterrando-os no passado.

Pedro Maranhão – Presidente da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema)

Liderado pelo deputado Arnaldo Jardim, o processo de discussão do projeto de lei contou com uma ampla gama de atores e equilibrou perfeitamente as oportunidades de descarbonização da economia com a progressividade necessária para que não haja aumento de custos.

Conheça o monitoramento nos Três Poderes sobre os principais assuntos do setor de energia feito pela solução corporativa do JOTA PRO Energia –  Num momento em que o mundo busca alternativas financeiramente viáveis e acessíveis no curto prazo para reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa e combater as mudanças climáticas, o Brasil se mostra como um celeiro de soluções ambientalmente adequadas e pode liderar nosso planeta rumo a uma economia de baixo carbono. Aliás, podemos dizer, sem medo de qualquer leviandade, que o Brasil pode se tornar para os combustíveis limpos renováveis o que a Arábia Saudita é hoje para o poluente petróleo.

Um dos grandes trunfos para a descarbonização da matriz energética brasileira é a utilização de biocombustíveis, especialmente o biometano. Este combustível, cujo mercado será impulsionado pela nova lei dos Combustíveis do Futuro, é originado a partir da matéria orgânica tanto do setor agropecuário como do setor de resíduos sólidos urbanos. Neste último o caso, o lixo orgânico que os brasileiros depositam em suas lixeiras pode se transformar em combustível para nossa indústria, nossa frota de caminhões pesados e até para nossas casas, com preços competitivos em relação ao gás de origem fóssil.

E é no tratamento adequado dos resíduos sólidos urbanos que podemos revolucionar nossa transição energética. Há fontes de combustível do futuro ainda inexploradas nos nossos aterros sanitários, que são complexas obras de engenharia que permitem a captura do gás metano e a sua transformação em biometano. Estudos recentes conduzidos pela Fiesp, Abrema, Única e ABiogás mostram que 16% do potencial de produção de biometano no Estado de São Paulo são oriundos dos aterros sanitários, montante suficiente para substituir quase 10% do consumo de gás fóssil do Estado.

Importante também destacar que o biometano de aterros sanitários possui custo de produção menor que as demais fontes. Como os aterros estão localizados mais próximos dos centros urbanos e dos polos consumidores, os ganhos logísticos são substanciais. Além disso, há claros ganhos de escala a depender do porte dos aterros, ou seja, quanto maior o aterro sanitário, menor o custo de produção do biometano.

Na lógica institucional do setor de resíduos, a legislação brasileira mais moderna favorece a instalação de aterros sanitários de maior porte, em detrimento dos aterros isolados que atendem apenas um município.

O Novo Marco Legal do Saneamento Básico, aprovado em 2020, reconhece a dificuldade de prefeituras operarem os aterros municipais e permite que diferentes municípios formem blocos para compartilhar a operação de aterros sanitários regionalizados. Assim, os grandes aterros não apenas são mais baratos para a destinação dos resíduos pelos municípios como também geram condições competitivas na produção de biocombustíveis.

A utilização de biometano de aterros sanitários já é uma realidade no Brasil, e tende a expandir-se exponencialmente a partir da nova lei. Um caso emblemático é o do Ceará, onde o gás originário do Aterro Sanitário do Oeste de Caucaia, na região metropolitana de Fortaleza, produz quantidade de biometano equivalente a mais de 20% do gás consumido no estado, evitando anualmente o lançamento de 500 mil toneladas de gás carbônico na atmosfera. Outros exemplos, nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, mostram na prática que o Brasil já domina a tecnologia.

Se por um lado temos boas notícias, por outro, é triste afirmar que temos no Brasil verdadeiros “poços de petróleo” desperdiçados, que são os grandes volumes de resíduos orgânicos que vão parar nos cerca de 3.000 lixões e aterros controlados no país. Com o fim do prazo determinado em lei para erradicação dessas áreas, são 3.000 crimes ambientais em andamento. Segundo dados do último Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil, publicado pela Abrema, 40% de todo o lixo que é produzido vai parar nestes ambientes. Se eles fossem substituídos por aterros sanitários, o Brasil poderia ampliar vertiginosamente sua produção de biocombustível.

Estamos falando de uma política pública alinhada a uma crescente cobrança interna e internacional por uma economia mais verde e uma cadeia de produção limpa e até carbono zero. Trata-se de questão de interesse nacional que pode colocar a soberania do Brasil em evidência dentro de um setor econômico cada vez mais necessário para a sustentabilidade global.

Cada vez mais empresas apostam no biometano como forma de reduzir emissões no uso industrial e na operação veicular. O Brasil empreende esforços para liderar a transição verde no mundo e o sucesso passa necessariamente pelo reaproveitamento de resíduos, que, de poluentes ao meio ambiente transformam-se em uma fonte energética limpa e de alto interesse econômico.

Disposição para investimentos já existe, mas há ainda muita lição de casa que o Brasil precisa concluir para transformar o que é jogado fora em recursos valiosos para país. Já passou da hora de deixarmos os fósseis no passado e abraçarmos o verdadeiro pré-sal renovável que se descortina.

PEDRO MARANHÃO
Presidente da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema)

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