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O Jornal Pequeno em sua edição impressa deste domingo recorda, o “caso Monte Líbano”, a “novela” de um processo que se arrasta desde 2016 no Poder Judiciário do Maranhão, em que uma empresa, mesmo com decisão transitada em julgado, não consegue receber seu crédito.

Após a última matéria, em julho de 2023, o JP buscou as recentes atualizações do processo. Iniciou analisando a ação rescisória de nº 0805814-43.2019.8.10.0000, movida pelo devedor Pactor, para tentar anular o resultado do julgamento favorável ao credor Monte Líbano, e observou que a ação foi julgada improcedente, sendo a Pactor condenada a pagar honorários de advogado à Monte Líbano. Observou, ainda, que as partes não podem mais apresentar recursos desde 08/04/2024, o que no meio jurídico denominam de trânsito em julgado.

Em seguida, o JP se debruçou acerca dos embargos de terceiro de nº 0811749-61.2019.8.10.0001, movido pelas empresas Terramata e Plaza contra a Monte Líbano, sob a alegação de que os bloqueios realizados em desfavor da Pactor impediram o recebimento da nota de empenho nº 2018NE03693, no valor de R$ 4.730.413,57 (quatro milhões, setecentos e trinta mil, quatrocentos e treze reais e cinquenta e sete centavos). Verificou a presença de uma sentença em 27.02.2024, extinguindo o feito sem resolver o mérito, por ter sido constatado pelo juízo que a Plaza já havia recebido o seu pagamento no curso do processo. O juízo da causa condenou a Plaza em honorários por ter recebido o crédito desde 2018 e nunca comunicado aos autos, deixando o processo tramitar por vários anos de forma desnecessária.

Por fim, pesquisando o processo principal, de nº 0828826-88.2016.8.10.0001, o JP verificou que a SINFRA cumpriu parcialmente a decisão de bloqueio do juízo, depositando judicialmente parte do valor devido ao credor. Consta, ainda, uma petição recente da Pactor, com vários pedidos. Inicialmente, requereu que o juízo não pague a Monte Líbano, sob a justificativa de que existe uma decisão em agravo de instrumento de nº 0807007-88.2022.8.10.0000, determinando que o juízo de origem não pague ao credor originário e não disponha do crédito. Defendeu que todo o crédito da Pactor junto à SINFRA deveria estar vinculado ao seu processo, que tramita na 6ª Vara da Fazenda Pública, e que o pagamento deve se sujeitar ao procedimento de precatório, requerendo o encaminhamento do valor depositado na Vara Cível para a Vara da Fazenda. Afirmou que a Monte Líbano induziu o juiz ao erro, pois teria solicitado o bloqueio de créditos junto à SINFRA depois da penhora no rosto dos autos. Ao final, requereu que o advogado da Pactor recebesse o valor depositado, uma vez que serviria como pagamento de honorários. Inclusive comunicou que representou contra o juízo no CNJ (Conselho Nacional de Justiça), registrado sob o nº 0001952-04.2024.2.00.0000, juntando cópia nos autos da execução principal.

O JP ouviu estudiosos do direito e alguns juristas, bem como analisou as alegações da Pactor na referida petição, e notou algumas inconsistências.

A alegação da Pactor, de que todo o crédito deveria estar vinculado ao seu processo que tramita na Vara da Fazenda Pública e se sujeitar ao procedimento do precatório, não condiz com a verdade dos fatos.  Em primeiro lugar, a Pactor não informou em sua petição, tampouco em sua representação, que, desde o ajuizamento da ação de execução da Monte Líbano em seu desfavor, datada de 14/06/2016, já recebia milhões de reais da SINFRA referentes a vários contratos firmados com esta secretaria, sem se sujeitar ao regime de precatórios. O JP acessou o Portal da Transparência do Governo do Maranhão (https://www.transparencia.ma.gov.br/), campo despesas, busca de fornecedores, e descobriu que, somente em 2016, ano do ajuizamento da ação, a Pactor recebeu mais de 22 milhões de reais da SINFRA (R$ 22.036.773,35). Continuou recebendo pagamentos vultosos nos anos subsequentes, 2017 (R$ 17.971.415,25), 2018 (R$ 18.820.836,96), 2019 (R$ 9.308.397,61), 2020 (R$ 7.677.298,30).

Observou que a ação da Pactor contra o Estado foi ajuizada em dezembro de 2019, (nº 0850732-32.2019.8.10.0001, na 6ª Vara da Fazenda Pública), período em que ainda recebia pagamentos na esfera administrativa, e também não informou ao juízo nem ao CNJ.

O JP descobriu uma segunda ação da Pactor movida contra o Estado, ajuizada no mesmo período (0850727-10.2019.8.10.0001, na 7ª Vara da Fazenda Pública), não informada ao juízo nem ao CNJ.

O jornal apurou, também, que, diante da repercussão do caso e quando houve a alteração do secretário da SINFRA, a Pactor não recebeu mais pagamentos na via administrativa, pois o novo secretário decidiu cumprir a ordem judicial ao constatar que o secretário anterior chegou a ser multado pelo juízo (decisão de Id. 23875516 em 15/04/2020).

Quando não conseguiu mais receber pagamentos da SINFRA, a Pactor passou a sustentar que a Monte Líbano não poderia recebê-los, tentando justificar que se trata apenas de um crédito judicial sujeito ao precatório, em flagrante tentativa de fraude à execução, conforme juristas ouvidos.

Os estudiosos também afirmaram que o juízo cível não se sujeita ao juízo da vara da fazenda, não podendo um interferir no outro, pois ambos possuem sua própria autonomia. E que a Pactor deveria, por ordem legal do artigo 774, inciso V, do CPC, ter indicado os valores e bens que estava a receber para penhora e pagamento a Monte Líbano, providência de que não se incumbiu, incorrendo em ato atentatório à dignidade da justiça, sujeito a multa e sanções.

Em relação ao argumento de que o pedido de bloqueio teria ocorrido após a solicitação de penhora no rosto dos autos, o JP apurou e constatou que a tese é equivocada.

Explorando novamente a execução principal da Monte Líbano, notou-se que o primeiro pedido de bloqueio de créditos data de 04/12/2016 (Id. 4471585), enquanto o pedido de penhora no rosto dos autos foi apresentado somente em 25/08/2021 (51473842); ou seja, quase cinco anos depois. Então, o pedido de penhora no rosto dos autos não foi protocolado antes do pedido de bloqueio, como defendeu o advogado da Pactor.

Sobre o pedido do advogado da Pactor de receber o valor sob o fundamento de que seriam seus honorários, os juristas comunicaram o JP que a tese é descabida e fere o próprio direito do credor em reaver seu crédito com prioridade. O advogado da Pactor deve cobrar seu cliente e não tentar receber do crédito da Monte Líbano, observam.

Por fim, no tocante à representação da Pactor ao CNJ, os juristas declararam ao JP que se trata de uma petição deficiente, uma vez que oculta todas as informações já mencionadas, o que poderia, inclusive, ser interpretado como má-fé. E que se trata de uma evidente tentativa de intimidação do juízo da execução, a fim de que não autorize o pagamento à Monte Líbano.

Procurado, o advogado da Monte Líbano falou sobre os últimos acontecimentos e disse que a situação é desgastante, preferindo não comentar. Perguntado se foi procurado alguma vez pelos representantes ou advogados do devedor, após insistência do repórter, declarou que chegou a ser contatado por um dos advogados da Pactor com uma oferta de acordo, mas que se revelou uma proposta indecorosa, pois o procurador disse que precisava receber os valores com prioridade, desrespeitando todo o prejuízo causado ao credor Monte Líbano e seu direito de preferência.

O JP prossegue acompanhando a situação e continua à disposição dos interessados que, por ventura, queiram se manifestar. (Do Jornal Pequeno)

 

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