Pouco conhecidos do público, mas cobiçados nos bastidores da indústria e da diplomacia, os chamados minerais de terras raras vêm ganhando protagonismo na economia global do século 21.
Essenciais para a transição energética e a produção de alta tecnologia, esses elementos estão no centro de disputas comerciais e geopolíticas entre potências como China e Estados Unidos.
O Brasil, com uma das maiores reservas do mundo, tenta transformar seu potencial em liderança estratégica.
Compostos por 17 elementos químicos, os minerais de terras raras são encontrados em pequenas quantidades e costumam estar misturados a outros minérios, o que torna sua extração e processamento complexos e custosos.
Ainda assim, seu valor comercial é altíssimo, pois são indispensáveis para a fabricação de turbinas eólicas, baterias de carros elétricos, cabos de transmissão, foguetes, equipamentos médicos, armas de precisão e dispositivos eletrônicos de última geração.
Segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos, o Brasil possui a segunda maior reserva mundial de terras raras — cerca de 21 milhões de toneladas — ficando atrás apenas da China, que não apenas lidera na extração, mas também domina a tecnologia de refino e beneficiamento desses minerais.
GEOPOLÍTICA E A CORRIDA PELOS MINERAIS ESTRATÉGICOS
A crescente importância desses elementos foi evidenciada por um acordo fechado em abril entre Estados Unidos e Ucrânia, voltado à exploração do potencial mineral ucraniano — que inclui não apenas terras raras, mas também ferro, manganês, urânio, titânio, lítio, zircônio, carvão, gás e petróleo. Parte significativa dessas reservas está em regiões atualmente afetadas pela guerra com a Rússia, como Donetsk, Luhansk e Dnipropetrovsk.
Para Washington, o pacto é estratégico: ajuda a reduzir sua dependência da China, que fornece cerca de 80% das terras raras utilizadas pela indústria norte-americana.
A parceria também seria, segundo o ex-presidente Donald Trump, uma forma de retribuição da Ucrânia pela ajuda militar e financeira recebida desde o início do conflito.
Na mesma linha, Trump anunciou nesta semana um novo acordo comercial com a China — ainda não confirmado oficialmente por Pequim — cujo eixo central gira justamente em torno das terras raras.
Fontes do jornal The Wall Street Journal afirmam que o pacto prevê a liberação temporária, por seis meses, da exportação de ímãs e minerais raros chineses para os EUA.
Em troca, os americanos reduziriam parte das tarifas sobre produtos chineses, que somariam agora 55%, sendo apenas 30% de novas medidas.
A disputa é acirrada. De acordo com o professor Adam Simon, da Universidade de Michigan, a China detém todas as patentes de processamento de minerais raros e concentra a maior parte da capacidade global de separá-los das rochas.
Ao retaliar tarifas americanas com restrições à exportação desses materiais, o governo chinês demonstrou como o controle sobre os minerais pode ser usado como ferramenta de poder geopolítico.
Apesar de sua vasta riqueza mineral, o Brasil ainda enfrenta grandes obstáculos para transformar esse ativo em motor de desenvolvimento tecnológico e industrial.
Um dos principais entraves está na ausência de domínio tecnológico para processar os minerais de terras raras em solo nacional.
O Ministério de Minas e Energia (MME) também reconhece a lacuna, mas vê nela uma oportunidade histórica.
INICIATIVAS EM CURSO
O governo federal tem atuado para superar esses desafios e tornar o país competitivo nesse setor estratégico. Entre as principais ações em andamento:
– Projeto MagBras: coordenado pelo SENAI, busca desenvolver uma cadeia completa de produção de ímãs permanentes de neodímio-ferro-boro (NdFeB), essenciais para carros elétricos e equipamentos eletrônicos, desde o beneficiamento até a reciclagem.
– Fundo de participação de R$ 1 bilhão: destinado ao financiamento de projetos de pesquisa mineral, com foco em empresas juniores.
– Decreto de 2023: autoriza a emissão de debêntures incentivadas para investimentos em transformação de minerais estratégicos.
– Chamada pública de R$ 5 bilhões: lançada pelo BNDES, FINEP e MME, com o objetivo de apoiar planos de negócios voltados à industrialização de minerais estratégicos.
– Estudos do Serviço Geológico Brasileiro (SGB): mapeamento de áreas com potencial de terras raras e avaliação da viabilidade de extração a partir de rejeitos de mineração.
JANELA HISTÓRICA E CONSCIÊNCIA ESTRATÉGICA
Segundo especialistas, a abundância mineral brasileira deve ser encarada como uma vantagem estratégica e não apenas como fonte de exportação bruta.
Para Carmona, os minerais críticos e estratégicos devem ser tratados pelo Brasil como ativos geopolíticos capazes de alavancar setores como defesa, ciência, tecnologia e transição energética.
Com solo fértil, energia limpa e vastos recursos minerais, o Brasil tem diante de si uma oportunidade rara — e urgente — de se posicionar como protagonista da nova economia verde e digital do século 21. Mas, para isso, será preciso mais do que boas intenções: será necessário planejamento, investimentos e, sobretudo, visão estratégica.