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O que antes era visto como um desejo de muitos trabalhadores, o emprego com carteira assinada passou a ser motivo de deboche entre crianças e adolescentes.

Para alguns jovens, ter um emprego formal significa fracasso, pouca renda e falta de liberdade.

A influenciadora Fabiana Sobrinho chamou a atenção para essa nova percepção ao compartilhar um vídeo no TikTok relatando uma conversa com sua filha de 12 anos.

No registro, a menina explica seu medo de ser CLT no futuro: “Andar de ônibus todo dia. Muita gente, chefe, pessoas mandando”, disse ela. Fabiana também afirmou ter ouvido falas semelhantes de outros jovens.

Nas redes sociais, outros relatos reforçam essa tendência. Um usuário do X (antigo Twitter), que trabalha como acompanhante terapêutico em uma escola, contou que viu crianças ameaçando um colega ao dizer que ele viraria CLT caso não se comportasse.

Outro professor relatou que seus alunos do 6º e 7º ano usam o termo de forma pejorativa, associando-o a baixos salários e falta de sucesso.

Influência dos “coaches mirins”

Esse pensamento tem sido alimentado por influenciadores infantis que incentivam a rejeição à educação formal e ao trabalho tradicional.

Em janeiro, o UOL publicou uma reportagem sobre os chamados “coaches mirins” — crianças que viralizam na internet ensinando supostos atalhos para ficar rico e desmerecendo a escola e o emprego formal.

Em um dos vídeos, uma dessas crianças diz: “Para ser pobre, estude, faça uma boa faculdade e encontre um bom emprego. Agora, para ser rico, faça totalmente ao contrário.”

Esse tipo de discurso contribui para a ideia de que a CLT representa fracasso, reforçando uma visão consumista e baseada na meritocracia extrema.

Especialistas alertam para riscos dessa mentalidade

Maria Mello, coordenadora do programa Criança e Consumo, do Instituto Alana, alerta que essa visão distorcida pode gerar impactos negativos no futuro desses jovens.

“As mensagens passadas são contrárias a uma perspectiva de ganhos no longo prazo e podem afetar suas decisões profissionais e financeiras”, explica.

Já o advogado Bruno Minoru Okajima, especialista em direito do trabalho, destaca que a CLT tem sido usada de forma pejorativa, ignorando seu papel essencial na proteção do trabalhador.

“Ela assegura direitos básicos e evita a precarização das relações de trabalho. O discurso contrário à CLT pode aprofundar a informalidade e a retirada de garantias trabalhistas”, afirma.

Mello também destaca que essa mentalidade pode levar jovens a escolhas impulsivas, como empreender sem planejamento e evitar a formação acadêmica, acreditando que há um caminho fácil para a riqueza.

O que é a CLT e por que ela é importante?

Criada em 1943, durante o governo de Getúlio Vargas, a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) unificou normas trabalhistas e garantiu direitos como jornada máxima de 44 horas semanais, 13º salário, férias remuneradas e FGTS.

A Constituição de 1988 ampliou essas garantias, tornando o mercado de trabalho mais equilibrado e protegendo os trabalhadores de condições precárias.

Antes da CLT, o trabalho no Brasil era caracterizado por jornadas exaustivas, falta de direitos e vulnerabilidade dos trabalhadores.

“Mais do que um conjunto de regras, a CLT reflete conquistas históricas da classe trabalhadora e continua sendo essencial para garantir um ambiente profissional justo”, ressalta Okajima.

Apesar do surgimento de novas formas de trabalho, como o autônomo e o MEI, especialistas reforçam que a CLT continua sendo indispensável para milhões de brasileiros.

A demonização do emprego formal entre os mais jovens pode resultar em uma geração despreparada para o mercado de trabalho e mais suscetível a condições precárias e instáveis.

*Por UOL

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